Esta semana, ouvi uma resposta exemplar de um candidato a prefeito. Inquirido se era homossexual, respondeu que a pergunta somente faria sentido se fosse governar com a bunda.
Isso me lembrou algo que aconteceu há alguns anos. Eu tenho um amigo que é homoafetivo. O problema é que ele nunca havia me falado isso. Eu sabia que ele tinha um companheiro, mas ele era extremamente reservado sobre a sua intimidade, preservando-se contra o preconceito. Portanto, havia uma zona de constrangimento.
Um dia, resolvi rompê-la e convidei-o para jantar na minha casa, deixando claro que ele poderia convidar quem quisesse; o único preconceito que exercia, frisei, era contra os chatos.
A história é legal, mas hoje vejo que estava errado. Tenho alguns amigos chatos que adoro. Assim, mesmo contra os chatos, não se pode ser preconceituoso.
O homem é o único ser que pode utilizar a razão para guiar o seu comportamento no planeta Terra. A racionalidade implica certas responsabilidades. Não ser deliberadamente burro é uma delas. É exatamente isso o que nos tornamos quando, por opção, deixamos alguém pensar em nosso lugar.
Ser preconceituoso é deixar que outros pensem por ti. É recusar-se a vivenciar e refletir sobre a sua própria experiência. É negar, em suma, a principal característica que nos diferencia dos outros animais.
Voltando ao nosso candidato a prefeito, do qual, afora a referida resposta, eu não gosto, alguém poderia argumentar que é direito do eleitor saber se ele era homoafetivo. Ao que eu responderia: você já viu alguém perguntar a um candidato notadamente “hétero” como ele gosta de praticar sexo? No caso do nosso candidato, o preconceito reside na simples pergunta. A resposta, em verdade, é desimportante.
A melhor postura que já vi em relação à este tema foi a do ator George Clooney. Por anos, a imprensa divulgou rumores de que ele era gay. Ele nunca desmentiu. Há pouco tempo, finalmente deu uma entrevista dizendo que não dava a mínima aos boatos e que negá-los seria uma ofensa aos seus amigos homoafetivos.
Perfeito. A questão é desimportante. Não temos o direito de escolher de quem os outros gostam. Sequer decidimos de quem nós gostamos. Quantas vezes não nos vemos apaixonados por alguém que sequer sabe da nossa existência? Ou sabe e a despreza? Ou que nos trai? Como gostaríamos de arrancar esse sentimento do nosso corpo como um dente podre, para seguir em frente. E, no entanto, ele permanece ali. Machucando.
Em uma sociedade sadia, não se dita ao outro como ele obtém prazer, desde que isso não implique em prejuízo ou danos a terceiros, como no caso de sexo não consentido.
Esta crônica, deixo claro, não é dirigida ao fanático religioso. Se você acha que ou Deus ou o Diabo se importam por quem és apaixonado ou com a forma como os outros obtém prazer na cama, pare de ler aqui. Vá fazer outra coisa.
Não é, também, para aqueles que acham antinatural a homoafetividade (agora, convenhamos, você acredita que, em algum momento, alguém “inventou” gostar de uma pessoa do mesmo sexo? Que esse afeto não é uma simples manifestação humana como as outras?).
Ou ainda para as que negam a sua própria inclinação tentando, e muitas vezes conseguindo, matá-la noutras pessoas. Parem de ler. Vocês, em sua grande maioria, estão perdidos e não será uma simples crônica que lhes trará para luz.
Essa crônica é dirigida a você, que tem a pretensão de ser dono do seu próprio nariz e pensar com a sua própria cabeça. É a nossa omissão ou indiferença que dá espaço aos intolerantes, loucos e recalcados para discriminar, maltratar e disseminar o ódio.
Nós somos racionais e isto nos implica responsabilidades.
Não fuja das suas.