Responda as questões a seguir, todas elas referentes ao Brasil.
Qual a porcentagem de mulheres que engravidaram entre 15 e 19 anos?
Quantas pessoas têm um smartphone?
A taxa de assassinatos está maior, igual ou menor do que nos anos 2000?
Qual a porcentagem de pessoas que acredita na existência do inferno? E do céu? E de Deus?
O Instituto IPSOS promove anualmente uma pesquisa de percepção da realidade em mais de trinta países. No ano de 2017, foram 38, com uma amostragem de mil respostas por país. Você pode conferir os dados desse e de outros anos no seguinte link: https://www.ipsos.com.
Na pesquisa, são dadas três escolhas ao entrevistado, o que eleva a chance de acerto para mais de 33%, mesmo no caso de um “chute”. Uma “chance” que você não teve ao responder questões acima. É injusto, eu sei, mas vamos analisar injustiças maiores primeiro.
Quase 7% (mais especificamente 6,8%) das mulheres entre 15 e 19 anos têm ao menos um parto no Brasil. Um número alto, mas muito inferir aos 48% que a maioria dos brasileiros respondeu à pesquisa. O brasileiro acredita que quase a metade das mulheres até 19 anos já deu à luz.
Apenas 38% dos brasileiros tem um smartphone. Um número muito inferior aos 85% que a maioria indicou como resposta. Ao seu redor, todos parecer ter um smartphone, não é? Até os filhos pequenos dos seus amigos têm. Isso é apenas a prova de que você transita em uma faixa privilegiada da população.
A taxa de assassinatos permanece a mesma desde os anos 2000, embora 76% dos entrevistados acredite que ela está maior. No entanto, não há consolo nesta estabilidade. Ainda mantemos níveis de homicídio comparáveis aos de uma guerra civil nos centros urbanos. Mas parece que aumentou, não é mesmo? Por que temos essa sensação?
O avanço da miscigenação entre religião e política tornam os dados a seguir interessantes. Setenta e seis por cento dos brasileiros acreditam no paraíso, mas apenas 68% no inferno. Somente essa diferença já daria uma crônica a parte. O brasileiro é um otimista, ao menos quanto à sua vida depois da morte. E quase todos nós, 98%, acreditam em Deus – um dos maiores percentuais entre todos os países pesquisados.
Cada dado desses, entre dezenas de outros que podem ser obtidos na pesquisa deste ano e dos anos passados, revela um aspecto interessante da sociedade brasileira.
Fundamentalmente, contudo, o estudo revela que desconhecemos a nossa realidade. Põe em cheque nossos conceitos e, melhor, os nossos preconceitos. O estudo expõe a nossa ignorância. Qual a porcentagem das pessoas que vive no campo e qual a que vive na cidade? E na periferia das grandes cidades? Quantas pessoas têm acesso ao saneamento básico? E acesso à escola? E acesso à escola de qualidade?
Um dos maiores problemas do Brasil, como sociedade, é fechar os olhos para si própria. Quebramos nossos espelhos. Temos vergonha de chafurdar nas nossas próprias mazelas. Medo do que encontraremos.
Preferimos ficar na alienação e superficialidade. Agarrar conceitos leves e alegres. País do carnaval. Jeitinho. “O melhor do Brasil é o brasileiro.” Preferimos olhar para o mar do Rio de Janeiro e ficar de costas para os morros.
Para encontrar as nossas respostas, saber o que devemos fazer, devemos conhecer nossos problemas. Isso é lógica simples.
O encontro do Brasil consigo mesmo começa em você. Na conciliação entre o seu Brasil imaginário e o Brasil real. Dispa-se dos seus preconceitos e afunde os dedos na lama da realidade. Com esse barro é que construiremos algo melhor. Não há outra matéria-prima disponível.