O Organizado e o Desorganizado

O Organizado e o Desorganizado

Download desta Crônica em PDF

Ser organizado é ser chato. É fazer as coisas sempre da mesma forma. Organizados não jogam roupas pelo quarto. Eles dobram e as guardam, talvez até por cores. Metodicamente colocar as chaves da casa no mesmo pires. Usam o alicate e devolvem ao seu ganchinho, na parede mosaico, onde cada ferramenta tem o seu nicho específico, como na foto da propaganda da loja de ferragens. Ser organizado é reservar na agenda um tempo para cada coisa, inclusive se divertir.

A vida do Organizado perde muito em emoção. Ela nunca viverá o desespero da perda da chave do carro, dentro da própria casa, quando se está atrasado para algum compromisso. Não se envolverá naquela busca selvagem, que começa com uma corrida afobada pelos diversos locais em que você pode ter jogado o molho de chaves, passa por almofadas voando, um sofá caído para trás e berros de raiva, terminando em suor, exaustão e no olhar desaprovador de quem estava lhe esperando.

A vida do Desorganizado é um constante balançar emocional; da paz ao desespero, na batida de uma desatenção.

A aventura clássica do Desorganizado é a “onde está o meu passaporte” no aeroporto. Ela lhe dá aquela sensação de frio na barriga, de quem está mergulhando em uma montanha russa, totalmente de graça. Esta sensação é seguida pelo palpitar súbito do coração em angústia, ao imaginar que perderá o avião, a conexão, terá que procurar a embaixada… O horror, o horror.

Se você for observador, em qualquer embarque encontrará dois ou três Desorganizados passando por este carrossel de emoções. Para os homens, ele geralmente começa com um movimento lento. Uma batidinha no bolso peito, apenas para certificar-se que o documento está ali. E não está. Depois, acelerando lentamente, as mãos vão entrando em todos os outros bolsos. Antes do desespero, há uma rechecagem frenética nos mesmos locais. Ao final, o rosto do Desorganizado mostra um terror semelhante ao de quem olha para cima e vê um cofre caindo na sua direção. Ele então dá um pulo da sua poltrona e começa a checar o chão ao seu redor. Nesse momento, já se precipitou borda abaixo do abismo da angústia.

Para as mulheres, há um roteiro diferente, pois ele envolve aquele universo paralelo, onde reinam as forças que se opõe a qualquer espécie de organização – a bolsa.

A bolsa feminina é a confinamento do caos. Eu tenho algumas teorias sobre ela. O Big Bang, a explosão primordial que deu origem à expansão do nosso universo, deve ter ocorrido em algum chacoalhar dentro da bolsa da esposa de Deus. E, em homenagem a isso, até hoje elas são regidas por leis próprias da física. Em seu interior, corpos ocupam o mesmo espaço ao mesmo tempo e há dimensões paralelas, habitadas por doentes marotos, que se divertem escondendo coisas. Portanto, quando você vê uma mulher debruçada sobre sua bolsa procurando algo, apenas respeite e se afaste.

Mas a grande pergunta é: ser Organizado é ser melhor?

Depende.

Se você vai gerenciar um cartório, sim. Já se você vai dar uma festa, não. Festas de Organizados são como camisas engomadas e abotoadas até o gogó. Limpas, bonitas e geralmente desconfortáveis. Você nunca viu uma representação de Baco onde ele está de óculos verificando alguma lista.

Pela minha experiência, as mulheres desejam casar com um homem organizado, mas têm sonhos eróticos com o que não tem o pires das chaves.

E então, o que fazer?

Compra a droga do pires, mas joga as chaves em qualquer lugar de vez em quando, só para dar alguma emoção.

Comentários