O Terrorista

O Terrorista

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Ele estava sentado no banco, sob a sombra das árvores. O sol forte queimava lentamente tudo o que tocava à sua volta. O seu olhar estava perdido no campo verde à frente. Perguntou-se como aquela grama sobrevivia ao calor abrasador com aquela cor. Não se perca em devaneios. Concentre-se. Sua mente sempre lhe pregava aquelas peças, desviando a sua atenção para detalhes e futilidades, quando estava nervoso. Colocou a mão na mochila ao seu lado, conferindo pela enésima vez que ela continuava ali.

Ao longe, ouvia o barulho de sirenes. Sempre havia algum barulho de alerta em Washington. Carros de bombeiro. Carros de polícia. Helicópteros sobrevoando baixo. A sensação de vigilância, urgência e perigo não permitia que qualquer dia, por mais banal que fosse, fosse realmente banal. A não ser que se estivesse acostumado àquilo; o cheiro de medo sempre presente abaixo de qualquer outro que você sentisse.

Esse temor de que algo ruim poderia ocorrer a todo instante tornava o ar, que já era quente, denso. Caminhar ali era como mover-se em meio a um líquido. Essa densidade fazia um contraste grotesco com o National Mall. Um grande parque, com enormes áreas abertas, ao redor das quais estavam os principais prédios da Capital. Tudo o que você viu na televisão ou no cinema, quando se trata de Washington, está por ali. O capitólio, o obelisco, o monumento a Lincoln, a Casa Branca. A
Casa Branca é o seu objetivo. Foco! Ela estava ali, à sua esquerda. Escondida pelas árvores, mas ali. A cerca de quinhentos metros, como tinha calculado. Do ponto central do gramado à sua frente, poderia enxergá-la diretamente. E eles poderiam vê-lo também.

Colocou novamente a mão na mochila. O momento havia chegado. Não sentia o vento. Seria melhor que soprasse com intensidade. Era fundamental para o que pretendia fazer. Não se pode controlar tudo, conformou-se. Não teria outra chance. O seu tempo estava acabando. Iria em frente de qualquer forma.

Conferiu rapidamente se alguém o observava. Estava sozinho daquele lado do gramado. A segurança era intensa, mas não viu policiais ou militares próximos. Abriu rapidamente o feixe. Tentou manter o rosto sereno. Não perceber que estava sendo observado não trazia nenhuma certeza de que não estivesse. Ainda mais ali.

Sentiu na mão o carretel. A ponta da corda havia soltado e estava enrolada. Praguejou baixo. Trouxe a mochila para o colo e começou a trabalhar. Foram longos minutos de expectativa. O suor agora escorria pela sua testa e entrava em seus olhos, fazendo-os arder. Por fim, soltou o nó. Atou a ponta à parte de baixo do artefato. Olhou para os lados. Na parte distante do caminho onde estava, viu um policial parado. Ele estava distante demais para impedi-lo, antes que fizesse o que pretendia.

Retirou o artefato da mochila e o montou com gestos precisos. Já havia feito aquilo muitas vezes e, para o seu alívio, não cometeu nenhum erro. Conferiu novamente a corda. Desenrolou e conectou a longa parte de baixo.

Correu para o centro do gramado.

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Martinez consolava-se com o pensamento de que faltavam menos de duas horas para terminar o seu turno de vigilância, quando viu a corrida para o centro do gramado. Imediatamente, ficou alerta. Colocou a mão do botão do rádio, mas a deteve, analisando a situação.

Neste momento de hesitação, o artefato subiu.

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Ele teve que correr muito. A princípio, achou que o vento não a elevaria. Uma pequena rajada, contudo, o favoreceu. Ele deu corda, mas teve o cuidado de não a deixar frouxa demais. Os puxões sucessivos mantiveram-na acedente. Finalmente, sorriu.

A pipa destacava-se contra o azul do céu. Branca. Seu formato imitando uma pomba. Ainda sorrindo, fê-la dançar um pouco. Até sentir Martinez agarrá-lo pelo braço.

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Seria deportado no dia seguinte e proibido de retornar aos Estados Unidos. O oficial de segurança, ao final da noite em que passou detido e sendo interrogado, foi enfático. Se tentasse retornar, seria preso como terrorista.

Quando o oficial saiu, recostou-se na pequena cama. Não se importava com aquilo. Não tinha vontade de retornar. Ademais, sempre soube dos riscos de se empinar a pomba da paz naqueles dias.

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